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“Só falta ejacular”, diz homem trans sobre prótese

Ari nasceu com uma vagina, ganhou o nome de Ariadna e muitos vestidos. Queria mesmo era vestir outra pele. O sexo biológico dele não corresponde à sua identidade de gênero (lembra o drama de Ivan, personagem da novela “Força do Querer”?). Ari foi uma criança que invejava o universo masculino do primo e um adolescente angustiado que quis se matar. Aos 22 anos, estuda jornalismo e namora uma mulher. Há pouco tempo, sua vida sexual mudou com a compra de uma prótese peniana realística – feita por e para homens trans.

  • Como você se define?

ARI – Como homem transgênero, mas só pro entendimento das pessoas. Sou um ser humano, um indivíduo da natureza. Antes, quando não tinha conhecimento sobre o que acontecia comigo, eu achava que era lésbica ou só gostava de me vestir de uma forma mais masculina. Mas, desde criança, nunca me identifiquei com o meu corpo. Sou até um pouco corcunda porque, na idade em que os seios crescem, eu me curvava pra que não aparecessem. Hoje minha coluna dói pra cacete.

  • Você foi criado como uma menina – inclusive do tipo que “precisa” usar saia, brincar de boneca e gostar de rosa?

ARI –  Fui criado pelos meus avós numa família muito bem estruturada.  Eles compravam vestidos e saias, mas não me obrigavam a usar. Minha vó tentava “camuflar” a situação. Por exemplo, como ela é artesã, me dava uma bermuda… com uma borboleta pintada [risos]. Eu gostava do que dizem ser de menino: super-heróis, carrinhos, boneco de policial, subir em caminhões e mexer nas ferramentas do meu avô. E nunca me proibiram de brincar com essas coisas.

  • Quando você percebeu que, apesar de ter nascido com uma vagina, não se sentia uma mulher?

ARI – Desde que me entendo por gente. Mas ficou mais evidente por volta dos três ou quatro anos, quando meu primo nasceu. Comecei a perceber a diferença entre os órgãos genitais, o que dizem ser menino e menina. Nessa idade, as pessoas que te rodeiam também impõem as questões de gênero. Eu tinha inveja do corpo dele, das roupas que ele usava, dos brinquedos que ganhava, da forma como era tratado…

  • Como você lidou com essa sensação de inadequação depois da infância?

ARI – Já me gerou muito autoflagelo. Até uns quatro anos atrás, eu me cortava com aquele tubo acrílico de caneta. Minhas costas e meus braços são cheios de cicatrizes. São momentos de vazio e depressão. Tive pensamentos suicidas também. Há dois anos mudei para morar com a minha mãe. Ela é policial e sei onde ficam as armas… Agora tô melhor, mas já olhei muitas vezes pra elas. Hoje tenho poucos momentos assim. Dói acordar todos os dias, ter que me vestir e não enxergar quem de fato eu sou.

  • Assumir a sua identidade de gênero para a família foi um processo lento, natural, angustiante…?

ARI – Antes de entender que sou transgênero, me “assumi” como lésbica. Minha mãe diz que sempre soube e foi tranquilo. Minha vó descobriu porque uma tia me viu com a ex-minha namorada. Falou que tinha vergonha de mim, que andava na rua de cabeça baixa por minha causa, que não tinha me criado pra virar sapatão… Ela é evangélica e, de tudo que ouvi, uma frase nunca vou esquecer: “Eu tô orando pra Deus te matar”. Chorei muito. Eu morava com ela, passamos semanas sem nos falar, mas as coisas foram voltando ao normal. Hoje não tocamos no assunto. Não sei como ela vai se sentir quando souber que sou homens trans. Agora moro com a minha mãe, ela me apoia e é isso que preciso. Minha irmã, de oito anos, me chama de “ser estranho da natureza”. Mas é numa boa, entendo que é confuso pra ela mesmo.

  • As pessoas não sabem se você é homem ou mulher e ficam com receio de qual pronome devem usar?

ARI – Sim, o tempo todo. Hoje não machuca tanto quando me tratam pelo pronome feminino ou me chamam de Ariadna. Às vezes é até mais constrangedor pra pessoa do que pra mim. Quero fazer a mudança de nome nos documentos e nada mais justo que a minha mãe escolha meu novo nome.

  • Você faz tratamento hormonal? Pensa em fazer cirurgias para retirar a mama e readequar os genitais?

ARI – Faço terapia particular, tô no processo de avaliação para que um laudo comprove que sou trans. Depois tenho que procurar um endocrinologista para o tratamento hormonal. Com certeza gostaria de fazer as cirurgias. A remoção da mama é burocrática, demora e custa cerca de R$ 7 mil. Imagina a faloplastia (cirurgia que constrói um pênis)… Tenho um caminho muito grande pela frente, enlouqueço se me preocupar com isso agora.

  • Como é o sexo pra você – considerando suas questões com o próprio corpo?

ARI – Sexo é bom, mas não é tudo isso que dizem. Minha namorada gosta muito de transar, eu não sinto essa vontade. A gente transava só com dedos e língua, mas eu não queria que fosse assim a vida inteira. Hoje eu uso uma prótese peniana bem realística.

  • Essa prótese é tipo aquelas cintas penianas à venda em sex shop?

ARI – Não. Chama packer, é feita por um homem trans de Curitiba. Se eu te mandar uma foto da prótese, você vai achar que é nude. O material imita pele humana, absorve calor do corpo, tem formato perfeito, pintura realística com prepúcio, veias etc. Ela fica presa por uma cinta ou por uma cola própria pra pele. A minha packer custou R$ 365 porque tem as três funções: faz volume entre as pernas, dá pra urinar em pé e funciona no sexo. Pra ficar ereto, você insere uma “vértebra” de plástico. Além disso, a base da prótese fica encaixada próxima ao clitóris, então também sinto prazer.

  • E como você se sente quando está com a prótese?

ARI – Me ajuda a camuflar essa tristeza. É bizarro ter um corpo de mulher, com as curvas acentuadas e seios… e com um pênis. Mas, p*rra, eu não tenho outra escolha! Minha namorada diz que não tenho nada de feminino e nem repara. Não sei se fala a verdade ou só quer me dar um apoio moral. Mas pra mim ainda faz falta não ejacular…

***Este post foi originalmente publicado na coluna da Nath no Yahoo. Imagem: Pixabay

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