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O casal que virou ilha

A ilha que habitam fica isolada no meio do oceano. Foi tudo tão rápido e intenso que arrumaram as malas sem se dar conta de que aquele pequeno espaço de areia não comporta mais de dois seres humanos. Depois perceberam, mas já se bastavam. Aqui do continente, sabemos apenas que faz muito sol por lá – é que eles postam nas redes sociais. Não temos muitas notícias do casal nem nos vemos com frequência porque, bem, eles vivem numa ilha-isolada-no-meio-do-oceano-em-que-não-há-espaço-para-mais-ninguém.

Como amiga, sinto falta dela. Não dá pra ter certeza de que está feliz apenas pelo número de likes. E por isso eu ligo, eu mando mensagem, eu lanço sinalizador. Ela acena, avisa que está ótima e “plena”, sempre “muito ocupada” para qualquer programa sem ele. Nem chope nem cinema nem corrida no parque. Estranho primeiro: deve ser comigo o problema. Reparo em seguida: ela também se afastou dos nossos amigos em comum. Checo Instagram, Facebook, Snapchat, Orkut, Chat do Uol e até o Mirc: não há vestígio dela em contato com outro ser vivo.

Mentira minha. Há sim. Almoço com a família e ELE. Viagem com os sogros e ELE. O cachorro, o vaso de planta, a borboleta que pousou na perna dela são seres vivos. ELES na praia, ELES deitados na rede do sítio, ELES ajudando os pobres, ELES fazendo compras em Miami, ELES visitando uma exposição de arte, ELES abraçando Papa Francisco. Mas, gente, estão juntos há mais de dois anos e ainda não saíram da bolha novidade-paixão-metade-da-laranja? Por que ela mal apresentou o homem que tanto ama? Por que ele nunca quis conviver com pessoas que faziam tão parte da vida dela?

Remo até a ilha. Foda-se que não fui convidada. É minha amiga e eu tenho o direito de saber o que está acontecendo. Quando me aproximo, eles estão discutindo. Ouço um “cala boca” e espero ela revidar. Mas ela engole palavrão e choro. A razão da briga: ela queria peixe, ele queria lagosta – e é a lagosta que vai para a panela. O casal fica constrangido ao me ver por perto. Digo que, sei lá, só uma voltinha com ela pra matar a saudade. Ela disfarça, entra no barco. Ele diz para não irmos muito longe que “o mar é perigoso”. Liga de cinco em cinco minutos, investigando que horas ela volta e se tem outros barcos na redondeza, enquanto tento puxar conversa com minha amiga.

Peço que me diga se está feliz assim, morando num lugar tão isolado do mundo. “Tem coqueiro e água de coco”, ela responde. Não foi isso que perguntei. Quero saber se considera normal perder sua individualidade, se acredita que amor é isso, se não se incomoda com possessividade e ciúme. “Claro que é normal: quando a gente ama, quer o outro sempre ao lado, evita pessoas e situações, aprende a ceder pelo bem-estar alheio”, diz. “Você não sabe o que é essa plenitude porque __________ (preencha aqui com uma das alternativas: “nunca namorou”, “vive solteira”, “está num relacionamento há muito tempo”, “não é apaixonada de verdade por ele”)”. Fico com todos meus argumentos à deriva.

Ela volta pra ilha e eu, pro continente – não sei viver sem tudo e todos que me abastecem por lá. Moral da história: não ofereça colete salva-vidas a quem não pediu socorro nem enxerga que vai acabar se afogando.

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