“Newness” e o desafio da monogamia na era digital
Amor e desejo são necessidades humanas fundamentais – e independentes, se deixarmos a hipocrisia de lado. Podemos desejar sem amar; continuar amando ainda que o desejo cesse ou também se dirija a outras pessoas. Como conciliar, preservar e confinar essas necessidades a um relacionamento que comporta apenas duas pessoas? Queremos alguém que nos dê estabilidade, segurança, conforto. Queremos que esse mesmo alguém nos ofereça novidade, aventura, mistério.
Newness, filme que entrou na Netflix (Brasil) em janeiro, mostra como ficou mais complicado driblar esse paradoxo “até que a morte nos separe” em tempos digitais. Os protagonistas Martin e Gabi se descobrem no aplicativo Winx, versão fictícia do Tinder, graças ao match no status “busco f*das”. Antes disso, haviam tentado sexo com seus habituais contatinhos disparando mensagens do tipo… “Oi, sumido(a). Tudo bem? Planos pra hoje?”. Um clássico control C + control V na lista do Whatsapp.
Nas muitas cenas escuras, é a luz fria dos smartphones que revela os personagens. Olhos vidrados na tela, cabeça baixa, dedos práticos e ágeis como os encontros. Apesar das conveniências proporcionadas pela tecnologia, Martin se confessa frustrado com a solteirice: “Às vezes me sinto um dildo preso a um corpo quente”. Gabi, ao contrário, gosta de variedade e se empolga com inícios, não se vê casada. Apaixonam-se. Decidem morar juntos.
O casal se vê tentado pela conveniência dos aplicativos de encontro (Reprodução)
Não demora até que se percebam deitados de costas para o outro, cada qual num canto da cama, mexendo no celular (e mexidos pelas tentações ao alcance de um clique). A certa altura, gradativamente, abrem o relacionamento. “Talvez só o amor não seja suficiente”, reflete Gabi. Novas regras são? Qual o conceito de traição em um contrato não-monogâmico com cláusulas tão subjetivas?
Aqui paro com os spoilers. Newness traz o medo e a dor de ser franco – consigo e com quem amamos – a respeito dos nossos desejos. “O casamento improvável entre o sentimento de pertencer e o sentimento de liberdade com uma pessoa é provavelmente o grande desafio do amor na era moderna”, diz a famosa terapeuta de casais Esther Perel numa passagem do filme. Por que na era moderna? “Porque vivemos duas vezes mais que cem anos atrás e é difícil estar sexualmente com apenas uma pessoa por quarenta anos”, ela me disse nesta longa entrevista.
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*Este post foi originalmente publicado na coluna da Nath no Yahoo.
